Estou expandindo uma comentário que terminei de publicar no blog de minha filha, acerca de um vídeo da série Lu & Tero, do Rev. Marcos Botelho. O vídeo é legal mas teologicamente indigesto. Penso que entendo as intenções do Rev. Marcos, de passar à nova geração uma mensagem relevante. No entanto, seus pressupostos são equivocados em duas frentes:
Primeiro, ele sugere uma compreensão equivocada da divindade, “Deus é jovem”, como se o ser divino pudesse ser definido em categorias de tempo. É claro que podemos dizer que ele quis simplesmente tornar atual e compreensivo o entendimento de Deus, descrevendo-o como se tivesse características humanas. Isso é legítimo e, teologicamente, denomina-se antropomorfismo. O problema é que não cabe a nós criar antropomorfismos. O ideal é tentarmos entender os antropomorfismos que a própria Bíblia nos fornece. Nesses termos vejamos o seguinte:
- Preciso checar a Bíblia com cuidado para verificar se, em algum lugar, Deus é descrito como um “jovem”. Em uma rápida e, portanto, mui falível busca, não encontrei Deus utilizando esse tipo de antropomorfismo a fim de comunicar uma revelação sobre si mesmo. Isso deveria nos fazer pensar se é pertinente usar esse tipo de recurso para ensinar à geração atual sobre Deus.
- Em um momento-chave da revelação messiânica, Deus é denominado “Ancião de dias” (Daniel 7.13). Deveríamos refletir sobre a razão de Deus revelar-se como “ancião” e não como jovem. Seria o ideal divino refletir juventude ou maturidade eterna?
- É instrutivo meditarmos sobre a pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo (é isso mesmo, “nosso Senhor”; Jesus é Senhor e não “o cara” ou “Gezuis”, como afirmam alguns “botelhistas”).
- Um, ele só iniciou seu ministério depois de completar 30 anos, ou seja, ser considerado, no contexto da cultura judaica, um “homem adulto”.
- Dois, em um certo confronto com opositores judaicos, temos a impressão de que o Senhor Jesus, apesar de ter pouco mais de 30 anos, aparentava ter quase 50 (Jo 8.57).
- Três, no Apocalipse, o Senhor Jesus, homem glorificado com pouco mais de 30 anos de idade terrena, é descrito como tendo a “cabeça e cabelos […] brancos como alva lã, como neve” (Ap 1.14). Isso significa que ele assumiu as características do “Ancião de dias” da profecia de Daniel. Não se pode afirmar, a partir destes dados da Escritura, que Deus seja “jovem”.
O segundo equívoco do vlog do Rev. Marcos é que ele desconsidera o pilar de governo e discipulado bíblico da igreja. O “Ancião de Dias” estabeleceu uma igreja governada por “anciãos”, oficiais destacados para capacitar a igreja de modo que que os crentes sejam transformados de meninos em “adultos” (Ef 4.11-14). O alvo bíblico é não mais ser como menino. O projeto do Rev. Marcos, em minha avaliação, prima pela adultolescência – homens e mulheres com mais de 30 anos se comunicando e comportando como adolescentes e, a partir de agora, lidando com Deus como se este último também o fosse. Quando damos as costas ao padrão divino de crescimento espiritual, não podemos esperar coisas muito “legais”.
Um adendo: Deus não se revelaria hoje em linguagem banal, como sugere o vídeo, simplesmente porque Deus não é banal. Ele é o Altíssimo e Majestoso. Tudo nele e que diz respeito a ele eleva e sublima.
Penso que o Rev. Marcos, ao convocar para uma “comunicação transgeracional”, revela-se prisioneiro de sua própria cultura; uma cultura que considera o velho obsoleto e tudo o que é novo, bom. Ele demonstra um desconforto em ser “enquadrado” pela geração anterior. Seus discurso aparentemente inofensivo implica na geração anterior não intentar, em hipótese alguma, determinar qualquer modus operandi à geração atual; o máximo que os “velhos” podem fazer é tentar sugerir “valores” bíblicos. A Escritura, porém, determina que a geração atual crie a nova geração no conhecimento e disciplina do Senhor, a fim de que esta conheça a aliança. A geração anterior pode e deve determinar não apenas as crenças, mas também determinadas práticas da aliança (e isso envolve forma e linguagem sim) para a geração atual.
Oro para ser compreendido. Não sou defensor do tradicionalismo, nem me alinho ao qualquer espécie de fundamentalismo xiita. Entendo que deve haver sim diálogo entre as gerações, dentro da igreja e assumo que Cristo converte os corações dos pais aos filhos e dos filhos aos pais, de modo que ambas as gerações se edifiquem mutuamente. Penso que isso tem implicações para todas as áreas da igreja, especialmente para a adoração: Velhos devem cantar músicas contemporâneas e adolescentes e jovem devem aprender hinos. A igreja deve adorar, evangelizar, discipular, viver a comunhão e servir como uma família.
Ademais, não desprestigio a juventude. Crianças, adolescentes, jovens, adultos e velhos são a igreja hoje. Todos ao mesmo tempo. Quando se destaca um segmento em detrimento de outros há desequilíbrio. No entanto, a liderança cabe aos adultos – aos “anciãos” – que devem ser honrados e acatados.
Reconheço os esforços do Rev. Marcos em trabalhar com a juventude de forma fiel e impactante. Respeito a este irmão e colega que não conheço pessoalmente. Mas ele se equivoca teologicamente ao sugerir que a relevância é prisioneira da forma. Sobre isso, quem sabe, escreverei posteriormente.
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