Um leitor comentou meu post Sobre Incompetência Pastoral, encaminhando as seguintes perguntas:
- Qual é a base bíblica para diferenciar presbítero e pastor?
- E qual é a base bíblica para dizer que há um líder específico da equipe dos presbíteros?
Comecei a responder e o texto foi ficando longo. Daí decidir publicar este novo post.
Os líderes da igreja
[karma_builder_dropcap color=”golden” style=”round” dropcap=”Q”]uais são os líderes da igreja? Respostas diferentes são fornecidas pelos diversos sistemas de governo eclesiástico. No sistema presbiteriano a liderança é exercida em dois níveis: Oficiais — presbíteros e diáconos — e líderes de departamentos — diretorias de sociedades internas e coordenações de ministérios (tabela 01).[/karma_builder_dropcap]
Oficiais |
|
Concílios |
Presbíteros docentes |
Presbíteros regentes |
|
Junta diaconal (diáconos) |
|
Líderes de departamentos |
|
Sociedades internas (FI) |
Ministérios |
Tabela 1. A liderança na IPB
O governo na Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) é conciliar, ou seja, exercido em concílios. Nosso concílio maior é chamado de Supremo Concílio. Abaixo dele estão os Sínodos. Abaixo dos Sínodos, os Presbitérios (que agregam as igrejas de determinada região). Abaixo dos Presbitérios, estão os Conselhos locais.
Um concílio é uma equipe de trabalho formada por presbíteros (At 15.6). Na IPB há dois tipos de presbiterato: docente e regente. Os presbíteros docentes são os pastores, responsáveis pelo serviço da Palavra e Sacramentos ou docência e ordenados pelos presbitérios. Os presbíteros regentes são oficiais eleitos pelas igrejas, incumbidos do auxílio aos pastores no cuidado pastoral e administração ou regência da igreja.
O presbítero docente governa com os presbíteros docentes:
O ministro do evangelho é o oficial consagrado pela igreja, representada no Presbitério, para dedicar-se especialmente à pregação da Palavra de Deus, administrar os sacramentos, edificar os crentes e participar, com os presbíteros regentes, do governo e disciplina da comunidade.[1]
O pastor exerce, “juntamente com os outros presbíteros, o poder coletivo de governo”.[2] A administração civil da igreja exige a participação da maioria dos membros do Conselho.[3] Isso envolve os assuntos administrativos tais como elaboração e aprovação de orçamentos.[4] Esta forma de gestão — oficiais trabalhando em equipe — é baseada no ensino de Cristo: presbíteros docentes e regentes trabalham como amigos, para glória do Rei (Jo 15.15).
Presbíteros docentes e regentes são iguais em dignidade (figura 01). Ambos podem presidir presbitérios, sínodos e o Supremo Concílio.
Figura 1. A igualdade de dignidade entre presbíteros docentes e regentes
Os presbíteros
De modo geral, o presbítero é um líder de pastoreio (At 20.17, 28; cf. “pastores e mestres” em Ef 4.11; 1Pe 5.1-2).
Veremos que a Bíblia atribui aos presbíteros de cada igreja local o enorme dever de proteger e garantir a saúde do rebanho. Alguns de seus julgamentos mais assustadores são proferidos a pastores que falham nessa atribuição. Se a igreja local deixa de insistir que esse ensinamento bíblico seja obedecido, simplesmente porque os presbíteros não são profissionais pagos, essa igreja acabará sucumbindo aos ataques do Maligno.[5]
As qualificações requeridas para o presbiterato são listadas em 1Timóteo 3.1-7 e Tito 1.5-9 (tabela 02):
1. Um homem. 2. Bom caráter. 3. Apto para ensinar. 4. Maduro. 5. Marido de uma só mulher. 6. Um pai bem sucedido. 7. Bom governo do lar. 8. Moderado. 9. Sensato. |
10. Sem vícios. 11. Não apegado ao dinheiro. 12. Respeitável. 13. Hospitaleiro. 14. Não violento. 15. Amável (gentil). 16. Pacífico. 17. Boa reputação. |
Tabela 2. As qualificações para o presbiterato
De acordo com Driscoll, “bons cristãos se tornarão bons pastores. […] A liderança na igreja exige boa liderança em casa (na família) e bom testemunho na comunidade”.[6]
O pastoreio dos presbíteros
O presbítero docente é pastoreado pelo presbitério. Os presbíteros regentes são pastoreados pelos presbíteros docentes. O pastor efetivo ou titular preside o Conselho e a igreja local. Em consonância com os documentos doutrinários citados acima, a CI/IPB afirma que o cargo e exercício do ministro são os primeiros na igreja.[7] Os presbíteros regentes são membros da igreja, ovelhas pastoreadas pelo docente.[8] O presbítero docente pode, inclusive, exercer “as funções plenas de Conselho”, em casos extraordinários.[9] Ademais, é ele quem representa a igreja “ativa, passiva, judicial e extrajudicialmente”.[10] Isso é digno de nota no exercício da liderança pastoral. Presbíteros regentes possuem autoridade para conduzir os negócios da igreja juntamente com o presbítero docente. Quando surge um problema judicial, porém, o docente é o responsável.
Os documentos tanto doutrinários e litúrgicos quanto legais estabelecem que os presbíteros, em geral, prestam contas pela vida da igreja. Calvino entende que os “guias” citados em Hebreus 13.17 são não apenas os pastores, mas também os “outros líderes da igreja”.[11]
Há, no entanto, uma sutil diferenciação quanto à responsabilidade do presbítero docente. Este responde não apenas pela condução da igreja com os presbíteros regentes, mas também da condução destes para o bem da igreja. O Conselho está sobre a igreja; porém, o presbítero docente é pastor também — e inicialmente — do Conselho.
Em que situações o pastor trabalha com — como conservo — e sobre — como líder espiritual do Conselho? A resposta é simples: o oficial docente opera como operário da Palavra. Colocando de outro modo, quem, de fato, governa uma igreja presbiteriana é Deus por meio da Escritura.
Eis aí o poder eclesiástico claramente exposto, poder outorgado aos pastores da igreja, qualquer que seja o nome pelo qual são chamados. O que se requer deles é que, pela Palavra de Deus, pela qual são constituídos administradores, corajosamente ousem enfrentar todas as coisas e constranjam toda glória, altivez e poder deste mundo a obedecer e a sucumbir à majestade divina; que pela mesma Palavra eles tenham o comando sobre todo o mundo, edifiquem a casa de Cristo e destruam o reino de Satanás; que apascentem as ovelhas e matem os lobos; que conduzam os dóceis mediante ensinamentos e exortações; que se imponham aos rebeldes e obstinados e os corrijam; que liguem e desliguem, tosquiem e fulminem; mas tudo baseados na Palavra de Deus.[12]
Em suma, há ocasiões em que o presbítero docente deve liderar — pela autoridade da Palavra — os regentes (figura 02).
Figura 2. O presbítero docente pastoreia-lidera os regentes
Um ministro fiel liderará os presbíteros regentes sempre que estes necessitarem de direcionamento bíblico. Isso diz respeito à totalidade da administração da igreja que precisa ser, em cada detalhe, aplicação do modelo da criação e da doutrina do evangelho. Em determinadas situações o pastor terá de ser forte em Deus e para glória de Deus, impedindo que o conciliarismo descambe em condução frouxa, caprichosa e antibíblica do rebanho. Essa gestão mais grave também reflete o modelo de Cristo: o líder espiritual que é amigo exige obediência (Jo 15.14). Em outras situações — a maioria delas, em um Conselho saudável — prevalecerá o consenso amistoso.
Notas
[1] SUPREMO CONCÍLIO DA IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL. Constituição Interna da Igreja Presbiteriana do Brasil, doravante denominada CI/IPB, Capítulo IV, Seção 2ª, Art. 30. In: Manual Presbiteriano Com Notas Remissivas. São Paulo: Cultura Cristã, 2013. Grifo nosso.
[2] CI/IPB, Art. 36, alínea “g”, p. 35. Grifo nosso.
[3] Modelo de Estatutos Para Uma Igreja Local, doravante denominado EIL, Capítulo II, Art. 2, § 2º
[4] Cf. CI/IPB, Capítulo V, Seção 2, Art. 77.
[5] SITTEMMA, John. Coração de Pastor: Resgatando a Responsabilidade Pastoral do Presbítero. 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 13. Grifo do autor.
[6] DRISCOLL, Mark. Um Livro Que Você Vai Realmente Ler Sobre a Liderança Cristã. Niterói: Tempo de Colheita, 2010, p. 18; cf. p. 19-20.
[7] CI/IPB, Capítulo IV, Art. 32, p. 22.
[8] Op. cit., Art. 36 alínea “d”, p. 24.
[9] Ibid., Capítulo V, Art. 76, § 2º, p. 42.
[10] EIL, Art. 3, Parágrafo Único, p. 228.
[11] Cf. CALVINO, João. Comentário à Sagrada Escritura: Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, p. 395. Kistemaker também olha o texto de forma abrangente: “O escritor não está interessado na posição desses líderes — ele não dá qualquer ideia se eram presbíteros, bispos, pregadores ou professores. Antes, ele pede ao leitor que obedeça a eles”. Cf. KISTEMAKER, Simon. Hebreus. São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 596. (Comentário do Novo Testamento).
[12] CALVINO, João. As Institutas: Edição Especial Com Notas Para Estudo e Pesquisa. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. IV.XV.14, p. 111.
[13] Ibid., loc. cit.
[14] Ibid., loc. cit.
[15] Ibid., loc. cit.
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