Depois das primeiras semanas após minha mudança para São José do Rio Preto, diminuindo para duas a quantidade de caixas a serem abertas em minha biblioteca e, finalmente, colocando o mínimo de ordem em meu fluxo de trabalho, dedico algumas linhas para falar sobre Avatar, filme dirigido por James Cameron que tem ultrapassado marcas históricas de bilheteria.
Avatar leva a construção de uma realidade por meios digitais ao seu ápice. Se até aqui tínhamos os recursos tecnológicos como suporte à produção, em Avatar eles estão no centro de todo o processo. A experiência é, de fato, de completa imersão em Pandora, algo que é testemunhado não apenas pelos expectadores, mas também pelo próprio elenco do filme.
Se nesse ponto estamos diante de algo inovador, em outro aspecto, somos apresentados a uma antiga doutrina pagã. Parece que Avatar propõe como discurso central, simplista, ao meu ver, que somos responsáveis por utilizar adequadamente os recursos naturais. Porém, ele vai além ao apresentar Pandora, uma das luas de Polifemo, um dos três gigantes gasosos fictícios orbitando Alpha Centauri, como organismo vivo dotado de consciência. Pandora não é criação; trata-se de um ambiente rico que oferece conexão multiforme (tudo o que é vivo possui um dispositivo físico que funciona como um “hub” que permite uma mútua ligação umbilical). Ademais, Pandora é sagrada; possui transcendentalidade que pode ser acessada através de rituais mágicos. O quadro idílico oferecido por Cameron, sob esta ótica, nada mais é do que um retorno ao panteísmo e animismo — como eu disse no início deste parágrafo, o recrusdecimento do paganismo pré-cristão.
O que quero dizer aqui? Que Avatar deve ser evitado como um filme impróprio para os cristãos? Nada disso. Parece-me, pelo contrário, que podemos e devemos fazer uma leitura dos desafios por ele sugeridos à luz dos mandados criacionais. Sim, concordamos que deve haver uma melhor gerência dos recursos naturais, ao mesmo tempo em que nos distanciamos de respostas dissonantes da Escritura. E a resposta cristã à má administração de tais recursos é o cumprimento do mandado cultural: o homem foi feito vice-gerente da criação e deve cuidar dela coram Deo, ou seja, na presença e para a glória do Deus Criador.
Na verdade, o estado idílico dos Na’vi, os habitantes pensantes de Pandora, remete ao Éden, e a possibilidade de uma existência restaurada — explorada na última cena do filme, nada mais é do que a reverberação, na alma humana, da esperança da ressurreição. Em suma, encontramos em Avatar uma angústia legítima diante da dissonância entre o homem e o cosmos que o abriga, um desejo de conexão transcendente e um anelo pela possibilidade de começar tudo do zero — algo que na Bíblia é descrito como novidade de vida (2Coríntios 5.17). Por esse ângulo, mais do que mero entretenimento, estamos diante de uma obra que pontua tópicos para os quais o evangelho fornece preciosas respostas.
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