Os dez mandamentos: Notas gerais

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Ainda que toda a Bíblia seja importante, é vital que conheçamos alguns trechos em particular, dentre eles, os Dez Mandamentos. Eles são também chamados de Decálogo ou “a lei de Deus” porque revelam um padrão divino de perfeição espiritual e moral. Por eles descobrimos quem é Deus e o que ele exige de nós. Ao mesmo tempo, ao lidar com essa lei descobrimos muito sobre nós mesmos.

Leitura do Dez Mandamentos

Iniciemos lendo a passagem que contém os Dez Mandamentos (Êx 20.1-17).

Decálogo
Moisés e as Tábuas da Lei
Rembrandt.

Introdução

1 Então, falou Deus todas estas palavras: 2 Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão.

Primeira parte da lei: Deveres para com Deus

[Primeiro mandamento:]3 Não terás outros deuses diante de mim.

[Segundo mandamento:] 4 Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. 5 Não as adorarás, nem lhes darás culto; porque eu sou o SENHOR, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem 6 e faço misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus mandamentos.

[Terceiro mandamento:] 7 Não tomarás o nome do SENHOR, teu Deus, em vão, porque o SENHOR não terá por inocente o que tomar o seu nome em vão.

[Quarto mandamento:] 8 Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. 9 Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. 10 Mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR, teu Deus; não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro das tuas portas para dentro; 11 porque, em seis dias, fez o SENHOR os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o SENHOR abençoou o dia de sábado e o santificou.

Segunda parte da lei: Deveres para com o próximo

[Quinto mandamento:] 12 Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o SENHOR, teu Deus, te dá.

[Sexto mandamento:] 13 Não matarás.

[Sétimo mandamento:] 14 Não adulterarás.

[Oitavo mandamento:] 15 Não furtarás.

[Nono mandamento:] 16 Não dirás falso testemunho contra o teu próximo.

[Décimo mandamento:] 17 Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma que pertença ao teu próximo.

Notas gerais sobre o decálogo

O texto lido permite elaborar algumas considerações.

Deus é pessoal e libertador

A passagem nos apresenta um Deus pessoal, “o SENHOR, teu Deus”[1] e libertador, “que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão” (v. 2). O Senhor que nos livra deseja interagir conosco de tal modo que o consideremos “nosso.”

Essa percepção é importante para que não enxerguemos os mandamentos como camisas de força que nos impedem de ser verdadeiramente felizes. Os Dez Mandamentos nos colocam no contexto da liberdade oferecida por Deus, a verdadeira liberdade de caminhar ligados a ele, segundo sua vontade, não mais escravizados pela vontade do inimigo. A motivação divina por detrás dos mandamentos é o amor que acolhe e liberta.

Amor e dever

No Decálogo há deveres para com Deus (vv. 3-11) e para com os homens (vv. 12-17). Essa dupla divisão nos ensina que não podemos ser livres sem assumir responsabilidades. Um filho que decide casar-se assume as incumbências de trabalhar, administrar as finanças do novo lar e cuidar de sua esposa. Não há contradição entre amor e dever, pelo contrário, deveres são assumidos por quem ama.

Liberdade e proibições

Depois de libertar seu povo, Deus lhe deu proibições.

A idéia de uma religião norteada por “nãos” desagrada a alguns. Há quem diga que o cristianismo, para ser reconhecido como uma religião viva deve mostrar-se como uma fé positiva, focalizando as potencialidades do cristão e não proibições. Qualquer pai atencioso percebe a tolice de tal argumento. Ao dizer “não coloque o dedo aí” ao filho que se aproxima de uma tomada, o pai está protegendo-o.

O lugar que ele [Deus] designa para elas [suas criaturas] em seu projeto das coisas é o lugar para o qual foram criadas. Quando queremos algo além do que Deus quer que sejamos, estamos desejando na verdade aquilo que não nos fará felizes. As exigências divinas que soam aos nossos ouvidos naturais mais como as de um déspota e menos como as de alguém que ama nos conduzem aonde deveríamos querer ir, caso soubéssemos o que desejamos.[2]

Isso fica mais claro à luz das palavras de Jesus: “Em verdade, em verdade vos digo: todo o que comete pecado é escravo do pecado” (Jo 8.34). Percebe-se que liberdade é a capacidade de dizer “não” ao mal, de afirmar-se em obediência diante de Deus que nos ama. Sendo assim, não nos envergonhamos de falar que não fazemos certas coisas porque o Senhor não permite. Ao dizermos “não” àquilo que é errado, dizemos “sim” a Deus.

Bem-aventurado o homem que não anda no conselho dos ímpios, não se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores. Salmo 1.1.

Verdade absoluta

Os mandamentos demonstram que há coisas que agradam a Deus e nos fazem livres e outras que o desagradam e nos tornam cada vez mais escravizados. Isso indica que existe o certo e o errado, o verdadeiro e o falso. A felicidade consiste em alinhar-se à realidade tal qual é descrita por Deus. Ao assumir outras versões de realidade batemos de frente com a verdade absoluta do Criador e mergulhamos em amargura e frustração.

Os juízos do SENHOR são verdadeiros e todos igualmente justos. Davi, Salmo 19.9.

A vida organizada

O modo como o Decálogo é estruturado nos ajuda a organizar-nos em torno daquilo que é verdadeiramente importante: Deus e o próximo. As coisas realmente não funcionam bem quando invertemos essas prioridades. Viver voltado para o próprio umbigo é a atalho mais curto para a infelicidade eterna.

Aqui se encerra a questão. Deus dá aquilo que tem, não o que não tem. Ele dá felicidade que existe, não a felicidade que não existe. Ser Deus; ser como Deus e partilhar sua bondade, reagindo na condição de criatura; ser infeliz: só existem essas três alternativas. Se não aprendermos a comer do único alimento que o Universo cultiva — o único alimento que qualquer universo possível pode cultivar —, então só nos resta passar fome por toda a eternidade.[3]

Pilares permanentes

Por expressarem a moralidade de Deus os Dez Mandamentos têm valor permanente. Eles são pilares existenciais, válidos tanto para os judeus dos tempos do Antigo Testamento (AT), quanto para nós hoje.

Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra. Jesus, Evangelho de Mateus 5.18.

Notas

1. Grifos nossos.

2. LEWIS, C. S. O problema do sofrimento. São Paulo: Vida, 2006, p. 63.

3. Ibid., p. 64.

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