Primeiro nós vimos que o Dicionário Houaiss define vício como “defeito ou imperfeição grave”.[1] Em seguida, fomos apresentados ao pensamento de Agostinho sobre o modo, a espécie e a ordem. Agora, saibamos que Aristóteles afirmava que todo vício é um hábito, que “todo hábito é uma disposição”[2] e que um hábito é “uma qualidade dificilmente removível”.[3] Disposição, por sua vez, é “a ordem em algo que tem partes”.[4] Bons hábitos são boas disposições e os possui quem é interiormente organizado, ou seja, elimina a indisposição, que é a desordem entre as partes.
Hábito é alguma coisa que se tem,[5] e, ao mesmo tempo, que se pode abandonar ou perder e está ligado à nossa “inteligência desejante”.[6] Sendo assim, estabelecemos como hábitos aquilo que desejamos.
A Bíblia ensina que há bons e maus desejos. Podemos desejar segundo Deus ou contra ele (Gn 3.6; Sl 37.4-5). Os que são de Deus aprendem, pelo Espírito, a submeter-se à sua vontade, o que implica em renegar os maus hábitos e adquirir os bons (Is 1.16-17; Mt 6.9-10; 26.39). O Senhor dispõe — limpa e reorganiza — o coração dos eleitos para a prática do bem (Jr 31.33; Tt 2.12; 1Pe 1.2). Por isso dizemos não aos desejos da carne e dos olhos, bem como ao orgulho natural (1Jo 2.16), negamo-nos a nós mesmos e encontramos, unicamente no Redentor, significado, afirmação e plena liberdade (Lc 9.23; 1Co 1.30-31; Gl 5.16-17).
Longe do determinismo da Psicologia popular, afirmamos que vícios são hábitos e hábitos podem, pelo Espírito Santo, ser santificados. Eis uma das belíssimas facetas do evangelho.
A prática destas verdades bíblicas é dificultada pela dinâmica dos vícios, como veremos no próximo post.
Notas
1. “Vício”. In: HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Sales. (Org.). Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Versão 1.0.5a. Editora Objetivo Ltda., 2002. CD-ROM.
2. ARISTÓTELES, Predicamentos 9,a,10, apud AQUINO, Tomás de. Suma teológica. São Paulo: Loyola, 2005. v. 4, 49, 1, p. 37.
3. Ibid., 9, a, 3; 10-13, p. 38.
4. ARISTÓTELES, Metafísica C. 19: 1022, b, 1, apud AQUINO, op. cit., loc. cit.
5. O termo latino habitus é ligado a habere: ter. PLÉ, Albert. “Os hábitos e as virtudes”. In: AQUINO, op. cit., p. 35.
6. Ibid., loc. cit.
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