Convido você a refletir sobre a questão da licença poética da adoração, especificamente quando aos ditos “sonhos de Deus”. Pergunto: Até que ponto devemos ser doutrinariamente exigentes quando cantamos louvores? Não seria exagerado impedir os cristãos de entoar canções por eles apreciadas e que falam sobre os sonhos de Deus para conosco, ou do interesse divino em restaurar nossos sonhos? Seria possível — e desejável — sistematizar linguística e teologicamente o amor demonstrado no ato de adoração? Se ao “louvar” com tais músicas nós nos sentimos bem, se somos animados e motivados para a caminhada cristã, qual é o problema de utilizá-las? Mais: se música é Poesia, por que escravizá-la à Teologia?
Como pastor interessado em liturgia, tenho ouvido tais perguntas ao longo dos anos e respeito profundamente aqueles que as formulam, pois sei que, em sua maioria, são discípulos de Jesus que desejam sinceramente adorar a Deus. Sou obrigado, no entanto, a declarar como falsa a antítese entre adoração e doutrinação, uma vez que, no culto autêntico, unem-se “espírito” e “verdade” (Jo 4.24). Usando uma linguagem apostólica, “hinos e cânticos espirituais” são modos de expressão da “palavra de Cristo” que deve habitar ricamente em nós (Cl 3.16). A linguagem do amor, mesmo em sua mais sublime expressão poética e devocional, precisa publicar a sã doutrina. Considerando os dois mandamentos, não há diferença significativa entre quem se prostra diante de uma imagem esculpida em madeira e quem canta uma música com erros doutrinários; em ambos os casos, cultua-se um arremedo de Deus e seu evangelho; trata-se de adoração de acordo com os enganos de nossa imaginação; não segundo a Escritura.
Canções teologicamente corretas não denotam preciosismo xiita, mas amor que se importa em articular-se com o máximo de precisão, por respeito ao amado e, ao mesmo tempo, por um interesse em conhecê-lo mais e mais, como ele, de fato, é. Ademais, de que adianta sairmos de um “período de louvor” animados, se a fonte de tal motivação for um erro, uma crença discrepante com a infalível revelação divina? Podemos ser uma geração muitíssimo religiosa e ao mesmo tempo distante de Deus. Mais: no culto, tudo se submete à Bíblia: a Administração; a Arquitetura, a Retórica, a Música e a Poesia. Não se trata de servilismo das esferas da criação à Teologia, mas do funcionamento de cada uma delas perante Deus, segundo a Palavra, para glória do Altíssimo.
O que isso significa, na prática? Primar por um culto que agrade ao Senhor, ou seja, um culto bíblico. Menos do que isso é complacência que, ainda que bem-intencionada, não honra devidamente ao Todo-Poderoso. Nas canções entoadas na adoração, a licença poética deve ser sempre limitada pela exatidão doutrinária.
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