A gerência da igreja-família

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Igreja-instituição ou igreja-família?
Igreja-instituição ou igreja-família?

A cada dia que passa, a descrição bíblica da igreja como uma família se torna mais destacada em meu coração. No Antigo Testamento há a ideia de shebet, “tribo” (Js 7.16), mishpaha, “família” (Js 7.17) e bet, “casa” (Js 7.18). Esta última descreve a unidade menor, “parte interior” e mais aconchegante.

O Novo Testamento traz o termo oikeios, traduzido por “família”, em Efésios 2.19 e encontrado em dois outros lugares (Gl 6.10; “casa” em 1Tm 5.8). A família, oikeios, tem relação com oikos, a “casa” (cf. 1Tm 3.4-5) e ambos ligam-se ainda a oikonomia, administração (Lc 16.2 – a ideia de “dispensação” ou o trabalho do “despenseiro”; cf. 1Co 9.17; Ef 1.10).

Os detalhes do texto bíblico nos ensinam que a vida em família deve propiciar identificação e aconchego. O que chamamos individualidade ganha corpo em um contexto de familiaridade. Anda bem “pelas próprias pernas” quem recebeu colo. Os cristãos são ordenados a andar e correr, mas, para isso, precisam antes ser formados e amamentados (Gl 5.16; 1Co 9.24; Gl 4.19; 1Pe 2.2). Como bem lembrou o Rev. Francisco Lúcio Pereira, nas conferências do 74º aniversário da IPB Rio Preto, as ovelhas precisam ser alimentadas, dessedentadas e acalentadas. Isso ocorre na intimidade amorosa da igreja-família.

Além disso, a vida em família exige boa administração. Ouvimos aqui e ali que a igreja deve ser considerada como uma família e não como uma organização e esse é um fato – lidar com a família exatamente como se comandássemos uma empresa pode levar a resultados desastrosos. O ponto é que, de acordo com a Bíblia, família, casa e administração são ligadas entre si. A “mulher virtuosa” realiza bem uma série de tarefas administrativas (Pv 31.10-31). O líder da igreja deve administrar bem o seu lar (1Tm 3.1, 4-5).

A cuidadosa inspiração do Espírito Santo fez Paulo utilizar, em 1Timóteo 3, as palavras gregas episkopos (“episcopado”, v. 1) e proistemi (“governar”, v. 5). O primeiro é uma designação de função, normalmente traduzido por “bispos” e significa, literalmente, um “supervisor” (At 20.28; Fp 1.1; 1Tm 3.2; Tt 1.7; 1Pe 2.25). O último termo designa a tarefa de gerenciar. Seu sentido primário é “presidir” ou “supervisionar” – dito de outro modo, o bispo governa supervisionando.

Governar tanto a casa quanto a igreja implica em prover direção, distribuir tarefas, motivar, acompanhar e corrigir. Pais têm de ajudar seus filhos, por exemplo, na vida escolar. Eles precisam saber o que se passa com cada filho e suprir o necessário para que estes obtenham sucesso nos estudos, além de prover o necessário aos que não obtiverem o sucesso planejado. Isso exige aproximação e envolvimento.

No livro Managing: Desvendando o Dia a Dia da Gestão, Henry Mintzberg, um importante pensador da administração, relembra o velho ditado atribuído a May Parker Follett na década de vinte: “Os gerentes fazem coisas principalmente através de outras pessoas” (p. 25). Não se trata de nenhuma novidade. Deus orientou Moisés e os apóstolos a distribuírem o trabalho (Êx 18.13-27; At 6.1-7). Na verdade, naquilo que chamamos de “Grande Comissão”, o Senhor Jesus Cristo realiza uma sábia administração espiritual. Ele distribui serviço, delegando a nós uma parte importante da obra que precisa ser feita para o cumprimento de seu propósito de redimir as nações (Mt 28.18-20). Lucas parece entender que a história da igreja é uma continuidade da obra do Senhor Jesus (At 1.1). O apóstolo Paulo ensina que cooperamos com Deus na pregação do evangelho (1Co 3.9) e Pedro chega ao ponto de dizer que nossa colaboração na obra divina é tão importante que nós, cristãos mui falíveis, apressamos “a vinda do Dia de Deus” (2Pe 3.12).

Como Deus gerencia? Ele distribui o trabalho e verifica sua realização. Além de ordenar, ele se faz presente. Ele acompanha sua igreja na aplicação da disciplina (Mt 18.17-20; 1Co 5.4). Ele está conosco no discipulado (Mt 28.20; At 1.8). Ele caminha entre nós para motivar e corrigir (Ap 2.1; cf. 1.20). Em suma, ele age como “Bispo” – Supervisor – de nossas almas (1Pe 2.25). Este modelo divino de gerência torna absurda a concepção de um “gerente no pedestal, literalmente distante, simplesmente pronunciando estratégias para que todos as implementem” (Mintzberg, p. 92).

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