Marcas, modelos e singularidade ministerial

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A Igreja de Cristo é autenticada pelas três marcas sumarizadas pelos pais reformadores: pregação fiel das Escrituras, administração correta dos sacramentos e prática da disciplina. Tudo o mais é adaptação cultural, contingência histórica ou mero marketing.

Nesse sentido, as “marcas” da Igreja se diferenciam dos “modelos” de ministério. Marcas têm a ver com princípios imutáveis enquanto modelos relacionam-se com estilos ou respostas fluidas a contextos específicos. As marcas estão ligadas à Igreja Universal ou Católica, enquanto os modelos vinculam-se às igrejas como denominações ou comunidades locais. Destarte, as marcas apontam para padrões bíblicos absolutos enquanto os modelos, para esquemas de gestão condicionados pelo ambiente. Assim sendo, marcas são únicas e universais, devem estar presentes em todas as igrejas cristãs autênticas, ao passo que os modelos são diversificados e específicos, não se pode estabelecer um modelo de ministério como padrão absoluto para todas as igrejas.

Líderes cristãos devem dispor-se ao aprendizado contínuo. Daí a pertinência da leitura da história da Igreja e da interação com outros colegas, a fim de compartilhar as experiências do ministério. Deus nos ensina que, em muitos aspectos do trabalho eclesial, não é preciso “reinventar a roda”; podemos beber da sabedoria daqueles que nos precederam, aplicando alguns métodos que sejam adequados às igrejas nas quais servimos. Fechar-se para esse contato horizontal, afirmando não necessitar do diálogo com outros que fizeram ou estão fazendo coisas belas e eficazes para Deus, é, no mínimo, infantilidade, para não dizer empáfia desmedida. Dependemos uns dos outros e, além disso, precisamos julgar todas as coisas, retendo o que é bom (1Co 12.20-26; 1Ts 5.21).

Por outro lado, líderes devem aprender a comungar com Deus e a pensar. Líderes precisam discernir o que o Senhor deseja para a obra que foi colocada em suas mãos, específica e contextualmente. Para isso, é preciso olhar em três direções: para as Escrituras, que estabelece as três marcas; para as experiências dos irmãos, que fornecem alguns modelos e para o contexto pessoal do líder, que fornece os dados singulares para o seu serviço.

É aqui que a Igreja difere de uma empresa. Uma organização pode até ser “salva” da falência contratando serviços de uma consultoria. Uma igreja não pode ser restaurada ou fortalecida apenas importando modelos de ministérios, porque cada líder e comunidade possuem singularidades.

Um exemplo é a Igreja Saddleback, de Lake Forest, Califórnia, pastoreada por Rick Warren. É possível alegrar-se como o modo gracioso como Deus conduziu o pastor Rick no estabelecimento da igreja, bem como observar alguns princípios úteis no modelo que ele denomina de “Igreja com Propósitos”. O ponto é que Saddleback é uma igreja singular. Para que tudo ocorresse como ocorreu, foram necessários:

  1. o decreto divino estabelecendo aquela igreja, naqueles moldes;
  2. o pastor Rick Warren com sua história de vida, perfil psicológico, família e vivências acadêmicas, profissionais e pessoais;
  3. Os líderes da equipe de ministério de Warren, com suas histórias de vida, perfis psicológicos, famílias e vivências acadêmicas, profissionais e pessoais;
  4. os membros da igreja Saddleback, com suas histórias de vida, perfis psicológicos, sociológicos, econômicos, famílias e vivências acadêmicas, profissionais e pessoais;
  5. as estruturas físicas, econômicas e financeiras da Igreja Saddleback;
  6. a A cosmovisão e ambiente cultural da sociedade que circunda Saddleback. É impossível reproduzir isso, cada igreja e contexto são únicos.

O último dado a revelar é que cada igreja possui problemas, limitações e idiossincrasias também singulares. Rick Warren, Bill Hybels, da Willow Creek Community Church, John MacArthur Jr., da Grace Community Church ou Armando Bispo, da Igreja Batista Central de Fortaleza, lidam com dificuldades ímpares, que normalmente não são expostas nos seminários sobre modelos de ministério. A idéia de que existem modelos ministeriais perfeitos, se não é pueril, não passa de marketing muitas vezes implementado não pelos líderes de tais comunidades em si, mas por seus admiradores um tanto quanto fanatizados.

Não conseguirei reproduzir o Tabernáculo de Spurgeon na Igreja Presbiteriana Central do Gama — infelizmente. É impossível, pois as pessoas, o contexto e o próprios planos de Deus para cada igreja são diferentes. Posso firmar-me nas marcas, posso aplicar alguns princípios pertinentes, mas não posso reproduzir completamente.

Do mesmo modo, a Igreja Presbiteriana Central do Gama não pode ser reproduzida em outro contexto. Tenho sido convidado para reunir-me com líderes de outras igrejas a fim de compartilhar o “modelo” da IPCG. Recebo os convites com constrangimento e suplicando ao Senhor por misericórdia. Faço questão de esclarecer que a IPCG é uma igreja simples, que luta para vencer todo tipo de desafios. Estamos tentando, com humildade, entender a Palavra de Deus e cumprir a missão. Esforçamo-nos há quase uma década para ultrapassar a modesta barreira dos 500 membros. Lutamos para manter a unidade do vínculo da paz. Precisamos muito mais aprender do que ensinar. Ainda assim, os convites persistem.

É importante compreender os modelos vigentes, apreciá-los, criticá-los e utilizar o que for bíblico e pertinente. Mas é fundamental e vital firmar-se nas marcas e, na dependência do Senhor, ouvir o que o Espírito Santo está nos falando sobre a igreja que está sob nossos cuidados, que é a expressão local do corpo de Cristo, bela e singular.

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